[LIVROS] Jogador Nº 1
“A prova de que
não é qualquer um que pode escrever um livro.”
Por Bruno Albuquerque de Almeida!
É com pesar que admito que, assim como o cinema, a
literatura caminha para o fim de obras preocupadas em manter a sua qualidade. E
Jogador Nº 1, escrito por Ernest Cline (o roteirista do bobo “Fanboys”) não é
diferente: preguiçoso, burocrático e extremamente didata, o livro só consegue
gerar repulsa – e sabota a própria ideia principal: fazer referências a games,
séries e filmes antigos.
Nota-se, pelo menos, que a ideia principal é muito boa.
Um universo que possui dentro dele todos os outros universos já criados, seja
para televisão, para livros, para o cinema e até mesmo para a música, possui
infinitas possibilidades de histórias e de abordagens para as mesmas, além de
poderem gerar personagens riquíssimos e marcantes. Por mais que se assemelhe a
Matrix, a OASIS de Cline vai um pouco além por ser uma referência (de todo o
livro, a melhor) a nossa internet, e como diversas pessoas pelo mundo
(inclusive eu)chegam a passar intermináveis horas conectadas a ela, vendos
páginas e páginas dos mais variados conteúdos. E nisso Jogador Nº 1 acerta em
cheio.
Mas os pontos positivos se limitam a esses, pois a partir
daí o livro é um desastre só. Cline aparenta possuir uma compulsão em explicar
tudo o que já está claro, até mesmo as referências que ele faz: no momento em
que Art3mis pede uma bebida na festa de aniversário de Og, Wade Watts (o
personagem principal), com sua narração um tanto equivocada, explica que a
bebida é a preferida de um personagem do filme Highlander. E, como se já não
bastasse tirar a exclusividade dos fãs
do filme sobre o guerreiro imortal entenderem a referência, Wade ainda diz em
que ano o filme saiu, e em diversos outros momentos explica até quem o dirigiu/
estrelou. E a pergunta que surge em minha cabeça é: “Para que?” E o que dizer
de Wade falando “Parece Rivendell. A cidade dos elfos de O Senhor dos Anéis” ?
Chega a passar vergonha alheia.
Não existe um motivo para as explicações detalhadas a
TUDO o que acontece na narrativa – quando Wade está passando pelo segundo
portão, ele detalha o jogo no fliperama e, após ter sido sugado para dento dele,
ele descreve o lugar aonde está e as roupas que vestia, dando a entender que
ele estava dentro do jogo que há poucos segundos estava jogando. Mas, num ato
nem um pouco natural, Wade explica: “Eu estava dentro do jogo. Eu estava na
pele no personagem. Eu iria viver o jogo.” Não transcrevi exatamente como está
no livro, mas a ideia é a mesma. Notou o didatismo exagerado e completamente
desnecessário?
Ao ler na orelha do livro que ele era “Original e repleto
de nostalgia”, esperava que ele realmente cumprisse isso. E ele cumpriu,
somente no quesito “nostalgia”, pois a originalidade foi pelo ralo: todo o
formato da trama é clichê (um grupo de adolescentes se une em busca de um
artefato raro, enquanto um vilão faz o mesmo e pode cometer as piores
atrocidades para impedir que alguém o faça antes, e blá blá blá), e quase tudo
o que acontece no livro, a partir de determinado momento, é completamente
óbvio: o Primeiro Portão e o desafio escondido lá dentro são completamente
inesperados, o que nos prende a leitura. Mas a partir do segundo portão, ele e
todos os enigmas e dúvidas foram respondidos da maneira mais óbvia e menos
metafórica do que aparentavam ser.
Os personagens são repulsivos: Art3mis é antipática,
grossa e fria, e por mais que ela se explique no final, não justifica o exagero
de seus atos; Aech não passa de um cara
engraçadinho e animado (comparações ao Rony da saga Harry Potter não podem ser
meras coincidências); Shoto, antes e depois da [SPOILER] morte de seu
irmão[SPOILER] é um deprimido sem personalidade ( aliás, por mais que os
personagens aparentem possuir cultura, TODOS eles carecem de personalidades bem
definidas); e Wade Watts é um cara com uma falta de amor próprio IMPRESSIONANTE
(note como, em diversos momentos, ele quase se joga aos pés de Art3mis, que a
partir de uma atitude de extremo carinho e amor dele passa a ignorá-lo por
completo, o que só prova que ela é uma mulher emocionalmente deprimida em alto
grau), que, sem exageros, chega a assustar.
A batalha final, sendo prometida por diversos personagens
como “a melhor da história do video-game”, não passa de três robôs gigantes se
batendo, além de matar diversos avatares banalmente. A “tática” narrativa de
Pista e Recompensa, que serve para mostrar algo no início da narrativa de
maneira singela mas que no final se mostra de vital importância, é repetitiva e
nem um pouco sutil. [SPOILER] Desde o início eu sabia que alguém estava
vigiando os personagens na sala de bate-papo (até o protagonista chega a
mencionar isso, o que só comprova o que eu falei sobre o livro ser extremamente
didata), e que a moeda de 25 cents iria ajudar Wade em algum momento da
história [SPOILER].
E a conclusão do livro não conclui nada, como se Ernest
Cline tivesse certeza de que o livro faria sucesso (e de fato fez, somente por
mencionar diversos filmes/ séries/ games que todo mundo gosta) e de que iria
fazer um segundo livro( o que não temos certeza ainda). Ele deixa em aberto
diversas possibilidades para o que viria acontecer. Enfim, como puderam notar,
é um péssimo livro. Mas leia-o, caso queira entender como não se escreve um livro
e a aprender muito bem com contras-exemplos.
Nota: 3,0
Ps: mais uma vez, venho alertar a Editora Leya que peça
aos seus tradutores e revisores para se dedicarem mais a qualidade do que o
tempo em que o livro chegará às prateleiras das livrarias. Porque, por exemlo,
é muito complicado não interromper a leitura por encontrar algo como “anais de
televisão” ou “um uma lugar”. Isso é somente mais um aviso para que a Editora
Leya melhore ainda mais o seu trabalho (a qualidade gráfica do livro Jogador Nº
1 e Clube da Luta é IMPECÁVEL).